“Em que espelho ficou perdida a minha face?”¹ (Cecília Meireles).
O tempo passa, as situações mudam, as pessoas que antes caminhavam lado a lado com você agora fazem companhia a outros, os filhos e a família crescem, e o seu rosto, antes sem marca alguma, denuncia que você não é mais a mesma. Cecília sabia do que estava falando, ela bem conhecia que, muitas vezes, a mulher que está em frente ao espelho não se reconhece mais.
Quem é você? Quem é esse rosto?
Inúmeros recursos são usados, todos os dias, para responder a essas perguntas. Enquanto uns tem preferências por respostas que contenham seus papéis sociais, outras preferem falar das experiências que tiveram ou daquelas que gostariam de ter, de preferências que possuíam e não possuem mais, de testes de internet (ode a MBTI!), de seu eneagrama, mapa astral, linguagens do amor, os famigerados 4 temperamentos, causas sociais ou políticas, experiências espirituais ou até mesmo palavras daqueles que as cercam.
Na sombra de tantos conceitos, de todos esses nomes que podem se dar ao “eu”, qual deles fica em você e o que ele causa em você? O “Eu, caçador de mim” de Milton Nascimento, encontra espaço em cada um que decide olhar para seu interior e encarar o caminho do autoconhecimento, enfrentando o desafio de ser consciente de si, de permitir-se inundar pelas inúmeras perguntas que emergem da temática.
Sou isto ou aquilo? Sou um ou vários? Sou tudo ao mesmo tempo? Sou quem eu sou ou sou o que fizeram de mim? Sou quem eu digo ser ou quem mostro ser quando entro em contradição? Afinal, quem eu sou?!
Bonhoeffer, teólogo do século passado, preso pelo movimento nazista por se levantar como resistência contra a política atual, em seus dias de cela se permitiu atravessar por essas perguntas. E o que, tamanho homem, concluiu? “Seja quem for eu, Tu sabes, ó Deus, que sou Teu!”².
Que rico caminho a ser trilhado no processo terapêutico, que trajeto assustadoramente (!) magnífico e que grande privilégio o de poder-se perder e encontrar!
Referência:
MEIRELES, Cecília. Antologia Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.
BONHOEFFER, Dietrich. Resistência e submissão: cartas e anotações escritas na prisão. São Leopoldo: Sinodal, 2003, p.468-469.